Análise Psicanalítica e Saúde Mental em A Família Addams
O filme não é apenas uma comédia gótica cheia de humor negro; ele também é um estudo sobre identidade, pertencimento e a subversão dos valores convencionais. A psicanálise pode nos ajudar a entender a dinâmica dessa família peculiar e sua relação com o mundo externo.
Tio Fester e a Busca pela Identidade Perdida
Desde o início, Fester está desconectado de sua verdadeira identidade. Ele acredita ser Gordon, filho de Abigail Craven, mas, ao longo da história, começa a desenvolver uma conexão genuína com a família Addams. Essa jornada reflete um processo psicanalítico de reencontro com o self reprimido.
Freud descreve casos em que traumas ou manipulações externas podem levar o sujeito a desenvolver uma identidade deslocada. No caso de Fester, sua amnésia representa um mecanismo de defesa, uma forma inconsciente de lidar com o afastamento de sua família original. À medida que o filme avança, ele passa por um processo de cura psíquica, reencontrando suas verdadeiras origens e assumindo seu papel dentro da família.
A Família Addams e a Inversão do Superego Social
Os Addams são a antítese da normalidade social: enquanto a sociedade tradicional reprime impulsos sombrios e busca a conformidade, eles vivem livremente seus desejos e afeições, sem culpa ou vergonha. Isso faz deles um exemplo de um superego alternativo, onde o amor e os laços familiares não são baseados em normas convencionais, mas sim na aceitação total do outro.
Gomez e Mortícia, por exemplo, possuem um relacionamento extremamente apaixonado e saudável – algo que contrasta fortemente com a frieza de muitos casais da sociedade convencional. Esse amor intenso e sem repressões pode ser visto como um modelo de desejo não castrado, onde os impulsos e afetos são expressos livremente.
Wandinha e Feioso: A Criança que Não se Deixa Domar
Wandinha (Christina Ricci) e Feioso (Jimmy Workman) são crianças que brincam com a morte e o perigo, mas dentro de um ambiente familiar onde isso é tratado com naturalidade. Isso pode ser lido como uma crítica à forma como a sociedade trata os impulsos naturais das crianças, reprimindo seus desejos e impondo uma padronização do comportamento infantil.
A psicanálise infantil mostra que crianças possuem uma relação diferente com a agressividade e a fantasia, e que a repressão excessiva desses aspectos pode gerar neuroses. No caso dos Addams, o ambiente familiar permite que essas expressões sejam vividas de maneira saudável, sem que os pequenos sejam patologizados por seus interesses “obscuros”.
O Final e a Aceitação do Outro
No desfecho, Fester recupera sua identidade e abraça seu lugar na família. Isso reforça a ideia de que a verdadeira identidade não é imposta de fora, mas descoberta internamente. Além disso, a derrota dos vilões mostra como a tentativa de impor a normalidade aos Addams é fadada ao fracasso – afinal, são os “normais” que agem de maneira corrupta e violenta, enquanto os Addams vivem suas excentricidades sem prejudicar ninguém.
Conclusão
A Família Addams (1991) é uma sátira brilhante que questiona os valores da sociedade tradicional. Sob a ótica psicanalítica, o filme fala sobre identidade, pertencimento e a importância de aceitar os impulsos naturais ao invés de suprimi-los. No fim, a mensagem é clara: ser diferente não é um problema – o verdadeiro problema é tentar se encaixar em um molde que não permite a expressão autêntica do self.