Análise Psicanalítica e Saúde Mental em Divertida Mente
O filme é uma verdadeira aula de psicologia e psicanálise sobre o funcionamento da mente humana, a construção da identidade e a importância das emoções reprimidas. Ele aborda o desenvolvimento psíquico da infância para a adolescência e a necessidade de integrar emoções complexas para alcançar um ego mais equilibrado.
1. O Conflito Entre Alegria e Tristeza: O Processo de Maturação
No início do filme, Alegria domina as emoções de Riley, acreditando que a melhor forma de protegê-la é garantindo que a felicidade prevaleça. Isso reflete uma visão inicial da infância, na qual a psique busca evitar o sofrimento e manter o prazer (princípio do prazer, descrito por Freud). No entanto, à medida que Riley cresce, a Tristeza começa a se manifestar mais, e Alegria tenta suprimi-la.
Na psicanálise, a repressão de emoções consideradas “negativas” pode levar a sintomas neuróticos, pois os sentimentos reprimidos sempre retornam de alguma forma (o retorno do recalcado). O filme mostra que a tentativa de afastar a tristeza apenas gera mais sofrimento para Riley, evidenciando que o desenvolvimento emocional saudável envolve a integração de todas as emoções, e não apenas da felicidade.
2. A Construção da Identidade e os Núcleos de Memória
No filme, a personalidade de Riley é representada por “ilhas” que simbolizam aspectos centrais de sua identidade (família, amizades, esportes, honestidade, etc.). Essas ilhas são sustentadas por memórias-chave, e quando Alegria e Tristeza desaparecem, a personalidade de Riley começa a desmoronar.
Isso remete à teoria da psicanálise sobre a importância da memória na formação do ego. Freud descreveu como experiências emocionais marcantes moldam o sujeito, e Lacan complementa ao afirmar que a identidade é estruturada pela linguagem e pelo imaginário. Quando Riley enfrenta um período de instabilidade emocional, seu “eu” entra em crise, e sua psique precisa reconstruir novas bases para sua identidade.
3. O Papel da Tristeza na Saúde Mental
No clímax do filme, Alegria percebe que Tristeza não é uma inimiga, mas uma parte essencial do equilíbrio emocional de Riley. Tristeza permite que Riley processe a perda, se conecte com os outros e encontre suporte emocional.
Isso se alinha com a visão psicanalítica de que o sofrimento não deve ser negado, mas simbolizado e elaborado. O luto, por exemplo, é um processo necessário para superar mudanças e perdas, e a tentativa de evitá-lo pode levar à melancolia ou a estados depressivos mais profundos.
A aceitação da Tristeza também reflete a ideia junguiana de individuação, um processo no qual o sujeito precisa integrar todos os aspectos de sua psique – inclusive aqueles que inicialmente rejeita – para se tornar um ser completo.
4. A Entrada na Adolescência e a Complexificação das Emoções
O filme termina com Riley aceitando a complexidade de suas emoções, simbolizada pelo surgimento de novas memórias que misturam diferentes sentimentos (felicidade e tristeza ao mesmo tempo, por exemplo). Isso representa a transição da infância para a adolescência, quando as emoções deixam de ser polarizadas e passam a ser mais sutis e multifacetadas.
Freud descreveu a adolescência como um período de intensas transformações psíquicas, onde conflitos infantis reaparecem e a identidade é reformulada. Em Divertida Mente, essa mudança é representada visualmente pela nova configuração do quartel-general de Riley, agora mais sofisticado e adaptável.
Conclusão
Divertida Mente é um filme extraordinário do ponto de vista psicanalítico, pois ensina de maneira acessível e simbólica como as emoções funcionam, como a identidade se forma e por que a tristeza é tão necessária quanto a alegria. Ele nos lembra que um psiquismo saudável não é aquele que evita a dor a qualquer custo, mas sim aquele que aprende a conviver com todas as suas emoções de forma equilibrada.