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Garota, Interrompida
Análise Psicanalítica e da Saúde Mental
“Garota, Interrompida” é uma reflexão sobre a linha tênue entre sanidade e loucura, além de um estudo sobre transtornos mentais sob uma ótica crítica da psiquiatria institucionalizada. O filme levanta questões sobre a subjetividade do diagnóstico psiquiátrico e a maneira como a sociedade define quem é “normal” e quem não é.
Susanna e o Transtorno de Personalidade Borderline
A protagonista recebe o diagnóstico de transtorno de personalidade borderline (TPB), caracterizado por impulsividade, instabilidade emocional, sentimentos crônicos de vazio e dificuldades em manter relações interpessoais. No entanto, ao longo do filme, questiona-se se seu comportamento realmente se encaixa nesse rótulo ou se é apenas uma jovem tentando lidar com sua existência e suas incertezas.
Do ponto de vista psicanalítico, o TPB pode ser entendido como um conflito intenso entre Eros (pulsão de vida) e Todestrieb (pulsão de morte), onde a pessoa oscila entre busca por conexão e autodestruição. Susanna sente que não pertence ao mundo, e sua luta interna reflete um ego fragmentado, tentando se equilibrar entre o desejo de se conectar e o impulso de se afastar de tudo.
Lisa: A Personificação do Id Descontrolado
Lisa, interpretada por Angelina Jolie, é diagnosticada como sociopata e representa o lado mais caótico e sedutor da psique. Ela age sem medo das consequências, manipulando e desafiando tudo e todos. Na teoria freudiana, Lisa poderia ser vista como a manifestação pura do id, o lado impulsivo e primitivo da mente, desprovido de culpa ou censura.
Lisa e Susanna desenvolvem uma relação intensa, típica de um vínculo simbiótico entre personalidades borderline e narcisistas/sociopáticas. Lisa encarna a liberdade extrema e a falta de responsabilidade, enquanto Susanna ainda sente remorso e dúvida, oscilando entre admiração e medo. Esse relacionamento reflete o conflito interno de Susanna: será que ela deve se render ao caos ou tentar encontrar um caminho para a recuperação?
A Instituição Psiquiátrica: Controle e Repressão
O hospital psiquiátrico no filme é um espaço de isolamento e contenção, onde as pacientes são tratadas com uma mistura de cuidados e repressão. A abordagem institucional, muitas vezes mecânica e impessoal, reforça a ideia de que a sociedade tem medo da loucura e prefere segregá-la a compreendê-la.
Do ponto de vista lacaniano, a instituição pode ser vista como o “Grande Outro”, que impõe suas regras e determina o que é real e aceitável. As pacientes são obrigadas a se conformar a uma lógica externa, e a “cura” se torna menos uma questão de recuperação genuína e mais de aceitação das normas impostas.
Conclusão: Loucura ou Identidade?
“Garota, Interrompida” questiona os limites entre saúde mental e identidade. Será que Susanna era realmente doente ou apenas uma jovem em crise existencial? Até que ponto um diagnóstico define uma pessoa? A psicanálise sugere que a loucura não é um estado absoluto, mas um espectro de experiências subjetivas.
No fim, a jornada de Susanna é menos sobre “curar-se” e mais sobre encontrar um sentido para si mesma fora dos rótulos que lhe foram impostos. O filme nos lembra que, em muitos casos, a verdadeira recuperação vem do autoconhecimento e da aceitação da própria complexidade – e não simplesmente do diagnóstico ou da medicação.