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Amnésia
Análise Psicanalítica e da Saúde Mental
“Amnésia” é um filme que transcende o gênero de suspense e thriller psicológico, tornando-se um profundo estudo sobre a memória, a identidade e os mecanismos psíquicos de defesa. Sob a ótica da psicanálise, podemos entender Leonard Shelby como um homem aprisionado em um trauma inassimilável, cuja mente constrói um sistema de negação para evitar o confronto com a verdade.
Amnésia Como Defesa Contra o Trauma
Freud descreveu a repressão como um mecanismo psíquico que mantém conteúdos dolorosos no inconsciente para evitar sofrimento. No caso de Leonard, sua amnésia anterógrada pode ser interpretada não apenas como uma condição neurológica, mas como uma defesa psicológica extrema. Sua mente se recusa a registrar novas memórias para impedir que ele enfrente o real impacto da morte de sua esposa e sua possível culpa na tragédia.
A fragmentação de sua memória reflete a fragmentação de sua identidade: quem somos sem nossas lembranças? Leonard tenta reconstruir sua história por meio de anotações e tatuagens, mas sua busca não é por verdade – e sim por um propósito que o impeça de encarar o vazio existencial.
A Construção da Realidade e a Falsa Percepção
Em sua obra, Lacan fala sobre como o sujeito constrói sua realidade a partir de significantes que sustentam sua identidade. Leonard é um exemplo de alguém que manipula a própria realidade, mesmo sem perceber. Ele se apega a pistas e instruções que ele mesmo deixou, mas que podem ser baseadas em equívocos ou distorções.
O filme desafia a ideia de um “eu contínuo”, mostrando que nossa identidade é sustentada por nossa capacidade de lembrar. Leonard, ao perder essa função, torna-se um homem sem passado e sem futuro, apenas vivendo em um eterno presente disfuncional.
A Vingança Como Pulsão de Morte
O conceito de pulsão de morte (Thanatos), descrito por Freud, é fundamental para entender o comportamento de Leonard. Ele não busca vingança apenas por justiça, mas porque a vingança se tornou a única coisa que dá sentido à sua existência. Ele está preso em um ciclo autodestrutivo, em que cada resposta gera uma nova pergunta e o mantém em movimento constante.
Na verdade, o próprio filme sugere que Leonard já conseguiu sua vingança, mas sua mente recusa essa verdade. Ele precisa perpetuar sua busca porque, sem ela, ele não teria razão para continuar. Isso reflete um comportamento neurótico: a repetição compulsiva de um padrão que evita a resolução do trauma.
Conclusão: O Esquecimento Como Prisão Psíquica
“Amnésia” nos leva a questionar o papel da memória na construção do “eu” e até que ponto somos reféns de nossas próprias narrativas internas. Do ponto de vista psicanalítico, a história de Leonard é uma metáfora para aqueles que vivem presos a uma versão distorcida da realidade para evitar o sofrimento.
A pergunta final não é apenas “quem matou a esposa de Leonard?”, mas “o que ele escolheu esquecer?”. No fundo, talvez a verdadeira tragédia não seja sua amnésia, mas sim a impossibilidade de aceitar a verdade e se libertar do ciclo de autossabotagem.